domingo, 27 de setembro de 2009

CENTRO DOS ESTUDANTES DE SANTOS - em 2010, 78 anos

CENTRO DOS ESTUDANTES DE SANTOS
EM 2010, 78 ANOS

PAULO MATOS (*)


Fundado em oito de janeiro de 1932, após percorrer mais de dois terços do século passado como exemplo de organização social e ação coletiva, a história dos 78 anos de participação social do Centro dos Estudantes de Santos – que completa neste janeiro de 2010, - tem muito da dedicação dos transformadores sociais. Como os militantes da JC – a Juventude Comunista do então clandestino Partido Comunista Brasileiro.


Foram estas forças as responsáveis pelos momentos locais de 1968, que inseriram Santos no mundo neste ano mágico, em busca de melhores dias para a sociedade. Apesar da devastação da ditadura militar contra a organização estudantil, após 1964, ela sobreviveu, física e politicamente, se reerguendo durante este ano, terminado com o Ato Institucional nº 5 em 13 de dezembro.


Em 1968, os meninos ficaram adultos e fizeram a opção pelo ataque às estruturas vigentes. Vestiam as roupas dos trabalhadores e as idéias dos transformadores, protestando, em todo o planeta. Queriam mudar, intervir na realidade cruel e adversa construída pelos poderosos.


Realizaram, então, mundialmente, as maiores mobilizações estudantis de todos os tempos, reivindicando liberdades, em um fenômeno que Marcuse explicou em Eros. Foi esse espírito que reuniu sempre os estudantes do CES que, 34 anos após 1968, faz 70 anos.


Fui seu personagem, hoje sua memória. Um resgate possível, em parte, pela abertura democrática dos arquivos do Estado. Está lá o Relatório Reservado/ 98, do CES, entre outras fontes e contribuições dos que restaram vivos e que fizeram possível este registro.


Edmar Cid Ferreira, personalidade cultural do ano e página da revista Isto é, presidente do Banco Santos e do Museu de Imagem e Som de São Paulo, já foi diretor do CES – o Centro dos Estudantes de Santos, nos anos 60. Também o hoje empresário Omar Laino, ambos militantes do CES. E o ex-deputado Gastone Righi, entre outros notáveis, como o hoje governador Mário Covas, Esmeraldo Tarquínio, Oswaldo Justo, Edmur Mesquita e Vicente Cascione. A entidade foi um celeiro de craques, como se diz na área esportiva.


O CES integrou e produziu muita gente boa. Nasceu em oito de janeiro de 1932, no salão do Ginásio Luso Brasileiro: os estudantes se organizavam na primeira entidade geral do país, antes mesmo da UNE. No dia doze, era eleita a diretoria provisória, oficializada no dia vinte. Logo após, os estudantes do CES formam a Falange Acadêmica, que iria engrossar os seis mil voluntários santistas que iriam para a frente de batalha no MMDC – a sigla formada pelas iniciais de Marcos, Miragaia, Drauzio e Camargo, os estudantes assassinados a 23 de maio em São Paulo e que deram nome à Revolução Constitucionalista de 1932.


Presidido por Daniel Gomes e Marcelo Árias em 2001, desde onze de setembro de 2000, ligados ao Partido Comunista do Brasil e estudantes de Direito, o CES hoje integra universitários e secundaristas. Na meta da retomada da mobilização dos estudantes pela redução das mensalidades, construindo e reconstruindo entidades - como afirma o dirigente estudantil. Antes dele ocupou o cargo Márcio Souza – presidente da junta de reconstrução - e Marcelo Lima, que por quase uma década controlou o CES.


A TRAJETÓRIA


O primeiro presidente da entidade, respeitada e atuante nos destinos da cidade, foi Edu Brancato – com a diretoria integrada ainda por Oswaldo Paulino, Eugênio Caetano dos Reis, Benigno Maia, Constantino de Menezes e outros. Em todas as lutas sociais, desde 1934, na gestão de José Leandro de Barros Pimentel – a greve pelos passes escolares nos bondes -, passando pelo O petróleo é nosso em 1946/1947, o CES esteve presente.


Foi o CES que em 1950, na gestão do presidente Inel Alves de Camargo, depois diretor da fazenda municipal, mobilizou a comunidade pela criação do Instituto Municipal do Comércio. Que se tornaria o Colégio José Bonifácio e que criaria a primeira faculdade na cidade, depois fechada. Outra luta que o CES venceu foi em relação à meia - entrada nos cinemas e a meia – passagem dos ônibus, conquistas então inéditas no país. A batalha contra o aumento das taxas escolares foi outra tarefa dos militantes do CES histórico, tornando responsável a juventude.


SEDES E PRESIDENTES


A primeira sede do CES foi a em cima da Galeria Brancato de Brinquedos, sendo a seguir alugada uma sala na rua do Comércio 15, depois outra na Brás Cubas. No sorteio da Associação Predial e através de uma campanha do rádio e de toda a imprensa, foi adquirida a sede da rua Sete de setembro 71. Em 1937, o presidente foi José Ubeira Franco e, em 1939, Mário Romiti, que inaugurou uma quadra de vôlei e basquete. Em 1940, assume Roberto Sasdelli - reeleito duas vezes -, vindo depois Florival Pinto, Roberto Blanco, Mário Cardoso (reeleito) e Horácio Perdiz – que liquidou as dividas da compra da sede.


Em 1947, na gestão de Valter Resende de Melo, ocorrem manifestações contra os aumentos escolares e problemas com a polícia. Vem depois os presidentes José Camargo da Cunha, Ynel Alves de Camargo, Silvio Antunes de Carvalho e Nelson Malavasi.

A 28 de março de 1955, na gestão de Oswaldo Leituga, é comprada a nova sede, na avenida Ana Costa 308. Custou Cr$ 560 mil - em que está até hoje, inaugurada em 8 de janeiro de 1957, no jubileu de ouro da entidade.


O estudante Milton Fuschini dirige a entidade e de 1960 a 1963, a presidência é novamente ocupada por Leituga. Em 1964, o presidente é José Alves Filho, membro da Juventude Comunista do PCB – em clima de altas conturbações políticas e do congresso estudantil, operário e camponês, em pleno 31 de março – cadeia pra muita gente. Gerson Martins, hoje advogado, era o secretário-geral.


ATIVIDADES


A sede da Ana Costa, a segunda, havia sido adquirida do pai de uma militante da casa, com os recursos auferidos com os grandes bailes que promovia na Sociedade Humanitária, em que só se ia de terno. Nos velhos tempos, anos 50, atuou como diretor cultural Gastone Righi – o depois advogado que, em 1964, libertaria os 1.200 presos do Raul Soares –o navio-prisão da ditadura que oprimiu esta cidade, um dos primeiros vinte cassados no país quando deputado federal.


A entidade promovia blocos carnavalescos, patuscados, olimpíadas, travessia do canal estudantil, cursos de alfabetização, jornalismo e biblioteconomia, concurso da rainha dos estudantes, teatro de vanguarda e montagem de barraca de praia – dos já citados maiores bailes da cidade, na Sociedade Humanitária.


O CES mantinha convênios com os clubes esportivos para livre freqüência dos estudantes – tarefas aglutinadoras reforçadas nas gestões dos militantes da Juventude Comunista. Na entidade militou Luiz Rodrigues Corvo, que aos 18 anos era secretário do comitê central do PCB, eleito vereador em Santos e o primeiro a ser cassado pela própria Câmara, amedrontada pelos gorilas que fariam a tragédia de 1964.


Em 1956, o CES promove um auspicioso concurso literário, o Penas de Ouro, então o maior do país. Em 1963, às vésperas do golpe militar, Thomezão e Valtinho, em mesas de xadrez nos trilhos do bonde na Avenida Ana Costa, impediam a circulação dos coletivos - pela redução das tarifas. Em 1968, Thomézinho, o irmão menor do Thomezão, ambos no céu, seria preso comigo no CES – fazendo história.


O DAY AFTER

Em 1964, a intervenção da ditadura sobre a entidade nomeou, para dirigi-la, o estudante Takeo Siosaki, sargento do Exército e presidente do grêmio do Canadá - em 20/3/65. Foi ele quem empossou Gilberto Minas e Miriam Pedro na direção do CES, estes que com que os membros da JC fizeram entendimentos que possibilitaram a reconstrução de 1968 - em uma assembléia dos grêmios estudantis da Baixada Santista, em 17 de agosto. Uma tarefa da juventude do PCB desde o início, concluída com a invasão do prédio pelos estudantes, reocupando seu espaço.


Em julho, no dia cinco, Santos se insere no mundial 1968, realizando uma grande passeata, articulada no CES junto com a UNE, a AUBS e a UEE – contra a ditadura e a violência, que havia assassinado Edson Luiz. A AUBS, Associação dos Universitários da Baixada Santista, presidida pelo depois jornalista João Moreira Sampaio Neto, ganhava uma sala no CES.


A TOMADA DA SEDE

No dia doze de novembro de 1968, os agentes do DOPS – Delegacia de Ordem Política e Social -, invadem o CES e prendem este hoje jornalista e o colega Nilton Thomé. O fato ocorreu durante a visita do então governador - interventor Abreu Sodré à Sociedade Italiana, em frente, descobrindo os cartazes produzidos para a passeata do dia quatro, que havíamos escondido no quintal. A manifestação foi impedida pela maciça repressão, com a praça Mauá, onde se realizaria o ato, ocupado militarmente.


O processo em função do fato (alegaram um inverossímil atentado ao governador), da Sétima Vara da Justiça Federal de SP, com sentença de 16/4/75 - assinada pelo juiz Dr. João Gomes Martins Filho -, toma dos estudantes sua sede, em termos antijurídicos, mas legais, nestes tempos de arbítrio. A representação estudantil havia sido reformulada pelo Governo Federal, inconstitucionalmente, pelo Decreto Lei 228, de 28/2/1967, proibindo sua existência.



O CURTO VERÃO DA DEMOCRACIA


O CES atuou intensamente neste curto período de abertura política de 1968, encerrado pelo Ato cinco. Promovendo passeatas, vigílias, panfletagens e dezenas de assembléias densamente freqüentadas, fazendo adultos os meninos de então. Foi o tempo da prisão de Max e Clóvis, a qual reagimos em diversas manifestações. O CES era dirigido pela junta integrada por Edmir Elias Albino (Carmo), Jaime Rodrigues Estrella Júnior (o Cebola, do José Bonifácio) e Antonio Carlos Paim (Canadá), eleita na assembléia que reconstruiu a entidade.


Antes dessa que chamávamos troika, concretizando o trabalho de Aníbal Ortega (do Martim Afonso) e Edvaldo Alves (do Luiza Macuco) - militantes da JC encarregados de renascer o CES, nos planos elaborados no bonde 17 -, tomou posse a junta composta pelos estudantes Daniel Gomes Rodrigues (presidente do GEVC, o grêmio do Canadá), Aníbal Ortega, Bartolomeu Lima (Luiza Macuco) e Luiz Pinto Dias.


Mas eis que em treze de dezembro chega o arbitrário Ato Institucional número cinco – quinhentas cassações e dez mil presos em todo o país. O CES é fechado, os grêmios proibidos, substituídos por Centros Cívicos – tudo dentro dos planos de controle dos estudantes pela ditadura. Em dezembro, o telex manda desocupar a sede: já estávamos longe. Iríamos operar a clandestina FME – Frente de Mobilização Estudantil, com pichações em toda a cidade denunciando a ditadura, combatida pelo CCC – o Comando de Caça aos Comunistas.


CEBOLA

Um dos membros da junta governativa do CES em 1968, Jaime Estrella Júnior - o Cebola - hoje denomina a Estação Rodoviária, uma homenagem do prefeito David Capistrano. Em 1975, resistiu à tortura imposta pelos militares no DOI-CODI, na época do assassinato na tortura do jornalista Vladimir Herzog, onde foi obrigado a pisar em brasa por tentar reorganizar o Partido Comunista Brasileiro. Era da Junta Governativa com Antonio Carlos Paim e Edmir Elias Albino.

Nessa época de barbárie, o patrimônio da entidade passa para a União, que o cede – apesar de não ser seu - para o MEC. Que o passa para a Universidade de São Carlos, por sua vez para o Projeto Rondon, que sai do prédio em 1981.

A propriedade retorna ao MEC que, em 1984, então dirigido por Marco Antonio Labella, ameaça vendê-lo para custear uma creche para a Universidade. Só em 1989, através de projeto do deputado federal do PT, Gumercindo Milhomem, a sede da Ana Costa voltaria às mãos dos estudantes – retomada de fato em 1982, a 22 de outubro.


A legalização da entidade caminhou com o advogado Sérgio Sérvulo da Cunha. A biblioteca do CES, que foi uma das maiores do país, desapareceu após as ocupações governamentais, junto com tudo o que existia lá, destruído como a sede.


PODE ME PRENDER, PODE ME BATER, QUE EU NÃO MUDO DE OPINIÃO...: EM 1980, A RESSURREIÇÃO!


Em 1980, o auge: ocorre o Congresso de Reconstrução do CES, que permaneceu inativo desde 1968, na Faculdade de Arquitetura – palco democrático de inúmeras manifestações nestes tempos. Foi a eleição de maior participação da juventude na entidade, que amplia sua representatividade para os universitários, além dos secundaristas – que já atuavam juntos em 1968.


Desse massivo encontro de centenas de estudantes, saem três chapas para a disputa: Todo Mundo no Centro, liderada por Eduardo Sanovicz (Arquitetura) e articulada pelos integrantes do PCB, então clandestino, e Mobilização Estudantil - que tinha, como candidato a presidente, o estudante Dogival Vieira dos Santos (Jornalismo).


Era a chapa de que eu fazia parte, reunindo o que seria a base estudantil do PT que estava sendo fundado. E os estudantes reunidos no MR-8, liderados por Marco Antonio Campanella (Turismo), na chapa Chega Mais, nome de uma novela global de então. Como pano de fundo, divergências quanto aos métodos de combate ao aumento das mensalidades escolares.


A eleição de 11 e 12 de junho de 1980 foi a maior que o CES teve em toda sua existência, apesar da repressão em algumas escolas impedindo o pleito, algumas promovendo até excursões para impedi-lo, como o Colégio Santista. Com cerca de 17 mil votos no total, quase um terço dos 60 mil estudantes da época, em 59 urnas nas faculdades e em 25 colégios particulares, em Santos, São Vicente, Guarujá, Cubatão e Praia Grande. Venceu a Todo Mundo com 6.845 votos, 1.231 de diferença, seguido da Mobilização com 5.674 e da Chega Mais com 4.168. Foi um dos grandes momentos da entidade, que fez história.


As diretorias são renovadas até 1987, um vácuo até 1989, prosseguindo após até este fim de século. Mas na fachada da sede já não há, nas colunas, as cores da bandeira paulista - e da liberdade -, o preto e o vermelho, a alma do CES.

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