sábado, 24 de janeiro de 2009

O ASILO A CESARE BATTISTI E A HISTÓRIA REVERSA

O ASILO A CESARE BATTISTI E A HISTÓRIA REVERSA
Paulo Matos (*)

As reações italianas à soberania diplomática brasileira já tiveram momentos semelhantes, só que reversos: foi quando a Itália protestava contra os maltratos e deportações dos seus nacionais, no início do século XX. Agora, querem nortear a diplomacia brasileira, chamando seu embaixador e contestando nossa decisão.

Era quando o Brasil impunha duras condições aos trabalhadores imigrantes, semelhantes às do escravagismo recente e os deportava em massa, provocando protestos da Itália que, inclusive, elegeu deputado um destes, chamado Antonio Vacirca. A Itália chegou a proibir a imigração para o Brasil em face desse tratamento.

É o que consta do livro deste autor, “Santos Libertária!”, Prêmio estadual da Fundação Faria Lima de 1986, o que ilustra eficazmente o episódio da concessão de asilo ao militante comunista Cesare Battisti, cujos prolongamentos estremeceram as relações do Brasil com a nação governada por Berlusconi.

A retomada de fatos pretéritos, ocorridos no início do século passado, deve servir à reflexão desta decisão da diplomacia brasileira. Na época do maior período de imigração de trabalhadores italianos para o Brasil, 3.500 entre 1871 e 1920. Na época, um jornal denominado “A Vanguarda” chega a propor a criação de uma “sociedade protetora de seres humanos”, em resposta a uma carta pedindo-a para os animais de carga.

Em 1891, o jornal O Estado de São Paulo publicava um artigo de Zózimo Barbosa em 20 de fevereiro chamando os imigrantes de “...gente vadia e desordeira”, criticando o sistema de incentivo às imigrações que substituíam a mão-de-obra escrava.Em 1907 foram expulsos do Brasil 132 trabalhadores, sendo 25 italianos, 18 em 1913. Até 1920, 550 trabalhadores foram deportados.

Tempo de castigos físicos e desvio dos salários, os italianos eram majoritários na imigração brasileira e também paulistana, onde ocupavam 61% dos 82% das lideranças imigrantes estrangeiras, em Santos 88% do total. Carestia, doenças, ausência de garantias sociais, torturas e invasões de domicílios eram comuns nessa época, além da violência nas ruas e surras no trabalho até para crianças de oito anos. Os tempos mudaram como os ritos diplomáticos da nação de Mussolini e Berlusconi.

(*) Paulo Matos é jornalista, historiador pós-graduado e bacharel em Direito, 1º lugar do concurso estadual da Fundação Faria Lima / CEPAM / Secretaria de Estado do Interior de 1986.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

MAÇONARIA, UMA MISSÃO

MAÇONARIA, UMA MISSÃO

(*)Paulo Matos

As associações de pedreiros-livres, dos pedreiros medievais, estão na raiz da maçonaria, como os construtores da catedral de Notre-Dame de Paris, que detinham e reservavam seus segredos de ofício. Estes não eram os da maçonaria, como se chegou a pensar, mas do ofício.

A partir do século XVII, tais segredos eram apenas simbólicos – o martelo, o colherão, o avental, o esquadro e o compasso. São os símbolos da Maçonaria, inclusive a designação de Deus como supremo arquiteto do universo.

A Maçonaria, ao contrário do que muitos pensam, não é uma religião, nem sociedade secreta. Não tem poderes mágicos nem lida com bruxarias, demônios ou coisas do gênero. Apenas faz o bem. É uma sociedade apenas discreta de existência notoriamente pública, com estatutos registrados em cartório e publicados na imprensa oficial.

A Maçonaria pode ser definida como uma entidade de caráter especulativo-filosófico, que pretende, antes de tudo, orientar os homens e as nações no sentido de uma determinada filosofia de vida, uma filosofia existencial que pratica a filantropia sem ostentação.

Extremamente tradicional, ritualística e hierarquizada, a maçonaria tem seus rituais e ensinamentos próprios, em que alguns são mantidos em segredo. Não é a Maçonaria inimiga das religiões, não sendo sectária.

Os pedreiros medievais, origem da maçonaria, estavam isentos da jurisdição dos bispos, eram livres, portanto. Daí a expressão pedreiros-livres, em inglês free-masons, em francês franc-mason. A partir do século XII, as associações de pedreiros-livres assumiram outras categorias como membros honorários, gente da nobreza, do clero, jurisconsultos e outros profissionais liberais que chegaram a constituir a maioria de seus membros – dando início a assim chamada Maçonaria especulativa, de caráter filosófico.

Em 1717 foi fundada a Grande Loja de Londres, reunindo, sob a jurisdição de um grão-mestre, as 4 associações deste gênero (lojas) em funcionamento naquele país, que se irradiaram rapidamente para o mundo.

SANTOS E SUAS AUTONOMIAS

SANTOS E SUAS AUTONOMIAS

Paulo Matos (*)

É notado por todos os que nos visitam que a Prefeitura não tem, como a Câmara, sua galeria de ex-prefeitos da cidade, fato de importância histórica que enriqueceria o patrimônio do prédio da Prefeitura. Desde o primeiro prefeito eleito há 107 anos – e esta é a idade do município de Santos, conforme norma da Lei Orgânica estadual então implantada -, a cidade elegeu 17 prefeitos. Em boa parte deste tempo, cerca de quatro décadas, a cidade esteve tutelada, sem poder eleger seus dirigentes. Reconquistamos a autonomia em 1936, 1953 e 1983, desta feita arrancando uma lei só para Santos, libertando-a.

Foi em três de outubro de 1834 que foi criado o cargo de intendente municipal, Carlos Augusto Vasconcelos Tavares, escolhido pela Câmara. A partir daí pudemos escolher o prefeito, que seria ele mesmo. Iniciada há mais de um século, nossa democracia foi interrompida cinco vezes, duas como em todo o país ( 1930 e 1937) e três só Santos, em 1947 (junto com algumas outras cidades “rebeldes”), 1964 e 1969 – completando 38 anos de tutela e 56 de prefeitos eleitos, até hoje.

Sete prefeitos foram escolhidos pelo voto popular de 1908 a 1930 e em 1936 escolheríamos para prefeito o mesmo interventor anterior. Substituído pelo vice, ficaria treze meses no cargo, pois em 1937 viria o “Estado Novo” e extinguiria todos os mandatos eletivos.

Em 22 de outubro de 1947, pela Lei 121, o município, então com 108 anos pela Lei 122 perdia, pela terceira vez, a sua autonomia – quando ia eleger o líder operário do porto, Leonardo Roitman, prefeito. Ele que seria, nas eleições seguintes, o vereador mais votado da cidade até os nossos tempos, com 6%de todos os votos válidos, 18 mil votos hoje. Era interventor Francisco Luiz Ribeiro e o irmão de Feliciano, Lincoln, fora interventor por dois meses, em 1945.

Em 1953, Santos elegeria prefeito o deputado federal Antonio Ezequiel Feliciano da Silva, vereador desde 1926, deputado estadual em 1928 e federal em 1945, professor da Faculdade Católica de Direito de Santos, que ajudou a fundar. Era o mesmo interventor de 23 anos antes, em 1930, quando fez parte da Junta Interventora junto com seus colegas do escritório de advocacia, Waldemar Leão e Leopoldo de Oliveira – que ficariam pouco mais de um ano no cargo, de outubro de 1930 a novembro de 1931.

Feliciano era o autor do projeto da autonomia santista, conquistada em 26 de novembro de 1952 pela Lei 1.743. Eleito em 1953, governando até 1957, seria sucedido por Silvio Fernandes Lopes, o notável engenheiro eleito pela “Frente Popular”. Este tomou posse em 14 de abril desse ano, com apenas 32 primaveras: vereador desde os 23 anos, faria o sucessor, derrotando nomes como o de Mário Covas, que tinha sido seu diretor de obras.

Mas o continuador de sua obra, o engenheiro Luiz La Scala Júnior, filho do sindicalista anarquista e vereador Luiz La Scala, desapareceria no dia da posse, vitimado por um acidente de automóvel. Era a grande tragédia santista. Tomaria posse o vice José Gomes, radialista, que seria cassado pela Ditadura Militar em 1964, quando ocupou o cargo o interventor e oficial da Marinha, Fernando Ridel. Silvio voltaria à Prefeitura de 1965 a 1969. E ganharia um busto do funcionalismo aos 35 anos de idade, em dois de abril de 1960.

Em 1968 ocorreria a eleição de Esmeraldo Tarquínio, cassado em 1969 junto com a autonomia, recuperada em 1983. Ele teria voltado ao cargo pela vontade do povo, mas faleceria em 10 de novembro do ano anterior. Em 10 de abril de 1970 seria nomeado o primeiro interventor, que nunca estivera antes na cidade, o General-de-Brigada Clóvis Bandeira Brasil, inaugurando uma série de quatro interventores e prefeitos nomeados.

Viriam Antonio Manoel de Carvalho, Carlos Caldeira Filho e, finalmente, Paulo Gomes Barbosa. Até que em dois de agosto de 1983, a Lei 2050 é assinada e vem a autonomia de Santos pelo vice-presidente Aureliano Chaves.

O Prefeito Oswaldo Justo, empossado em nove de julho de 1984, é o primeiro eleito após a retomada da autonomia. Vereador e líder das oposições (e depois do MDB) na Câmara Municipal, escolhido a três de junho desse ano, traz como vice o filho de Esmeraldo Soares Tarquínio de Campos Filho, Esmeraldo Tarquínio Neto. Sucedido pela ex-vereadora Telma Sandra Augusto de Souza e pelo médico David Capistrano da Costa Filho, elegemos em 1996 e 2000 o prefeito Paulo Roberto Mansur, o primeiro a ser reeleito conforme permitiu a legislação eleitoral, seguido pelo prefeito João Paulo Papa, também reeleito.

Santos, que não é só história política, mas da civilização brasileira, de José Bonifácio ao Padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão, o primeiro no mundo a subir ao ar em um balão, de seu irmão e embaixador Alexandre de Gusmão, que fez o tratado de Madrid e garantiu o Brasil de hoje, de tantos outros nomes forjadores desta nação, merece ter sua história contada.

CARTA ABERTA AOS AMIGOS DO PLANETA EM DEFESA DA PRAIA DE SANTOS

TEXTO PRESENTE NO PROCESSO DA PROCURADORIA FEDERAL PELA RETIRADA DA PLATAFORMA A PEDIDO DO PROCURADOR FEDERALJOSÉ DONIZETTI MOLINA DALOIA

CARTA ABERTA AOS AMIGOS DO PLANETA EM DEFESA DA PRAIA DE SANTOS:

PELA RETIRADA DA PLATAFORMA DO EMISSÁRIO SUBMARINO

“É mais fácil matar o dragão do que remover a carcaça” (Goethe)

Neste momento em que se ameaça (ameaçava, já está feito) construir um parque sobre a plataforma do Emissário Submarino de esgotos, elaborado pelo arquiteto Ruy Othake, é preciso atenção. Essa plataforma é um monturo de pedra e terra de 43 mil metros quadrados, que divide arbitrariamente a praia do José Menino em Santos, São Paulo. Inaugurado em 21 de julho de 1978 pelo General-presidente Geisel, fará (fez) 30 anos.

O custo do parque seria de oito milhões de reais, oferecidos pelo DADE - Departamento de Apoio e Desenvolvimento das Estâncias. Um dinheiro público que pode ser jogados no lixo. Esta plataforma é um monumento à Ditadura, que pode ter uma “arte” de 16 metros de altura e 62 de extensão. Vamos deixar?

A plataforma foi implantada nos anos 70 para ser um canteiro de obras do equipamento, um entulho de pedra e terra transitório. E não um território conquistado ao mar, como querem fazer crer impondo-lhe obeliscos, antes lojinhas, bares e museus futebolísticos (o Museu Pelé), todos vetados pela Justiça.

Querem fazer permanente a tragédia arquitetônica, quando existem tecnologias que fazem subterrâneos estes equipamentos. Mas esta está acima, por deficiência da construção, inclusive mais curto – o que faz voltar os excrementos.

Uma Ação Popular para sua retirada já foi movida pelo advogado Sérgio Sérvulo da Cunha, ex-vice-prefeito de Santos e ex-chefe de gabinete do ministro Márcio Thomaz Bastos, há mais de um quarto de século, paralisada por falta de perícia. Agora, volta a se falar de sua ocupação, quando existe processo para sua retirada e se fala em verbas do Japão para a SABESP, responsável por sua construção, “melhorá-lo”. Talvez reduza o volume de esgoto devolvido pelo mar para a praia...

A Justiça Federal, através da juíza da Quarta Vara Alessandra Nuyens Aguiar Aranha, autorizou a construção do parque em 18/9/2006. Mas não excluiu a possibilidade da plataforma ser removida no futuro, conforme pleiteia o Ministério Público Federal em abril de 2005, pelos procuradores da República José Donizzeti Molina Daloia e Luiz Antonio Palácio Filho. Oito milhões no lixo são “detalhe”.

É preciso concluir o que foi planejado, a retirada da plataforma, criminosamente mantida após a construção em um obscuro processo que cogitava garantir o equipamento e até um caminho para “anexar” a ilha Urubuqueçaba em frente, patrimônio ecológico, mascarando a defeituosa construção do emissário submarino acima da areia e mais curto do que o necessário. Tempos escuros da Ditadura Militar, quando foi feito.

O equipamento tem uma instalação menor do que a projetada e mais frágil do que deveria ser – exigindo que a plataforma fosse mantida para “segurar” o emissário. Que hoje faz retornar de tempos em tempos toneladas de dejetos para a areia – volumes fecais que só são “melhorados” na estação de tratamento, completando a tragédia da intervenção brutal sobre a área mais brilhante da cidade, sua praia. É muro divisor da areia, danoso à Santoso brutal sobre a nar os seus dejetos para a areia, completando a trage pedra e terra transit.

Imposta com a violência da intervenção não-estudada em seus impactos, a plataforma está causando a modificação da geografia praiana, alterando suas linhas e ameaçando os prédios da orla com as modificações na hidrologia marinha que causa.

Ocorre o assoreamento semanal dos canais que pontuam a praia de Santos cheios de areia (e o esvaziamento de praias contíguas, como as do vizinho município conurbado de São Vicente) são resultados de sua presença, produto de uma ação obscura da ditadura em tempos igualmente obscuros – a manutenção do canteiro de obras do Emissário, a plataforma.

O jornalista Rubens Fortes já mandou ao arquiteto seu irônico projeto de um “obeliscocô” para o local, um gigantesco trôço, melhor retrato da plataforma do emissário de esgotos que traz este “presente” para a cidade.

A plataforma é uma invasão sobre o mar que, a exemplo de diversas outras espalhadas pelo país, está causando devastação na natureza. Os surfistas aproveitam o lugar por causa de suas ondas mais fortes (e fazem campanha pela sua manutenção), prova da modificação do comportamento hidrológico e da devastação provocada. As marés altas levam a água a dez metros do jardim, nas cheias. Logo chegarão nele e nos prédios, que são antigos, de estruturas frágeis e não resistirão a estes tempos de aquecimento global.

As fotos anunciando o obelisco do arquiteto Ruy Othake na plataforma (já planejado para ser de Oscar Niemayer) para o local mostram claramente o avanço da areia em direção à ilha Urubuqueçaba, em frente, de um lado. E o recuo da areia em outro, aproximando o mar dos jardins. É uma irresponsabilidade absoluta a autorização de permanência deste entulho em tempos de aquecimento global.

Queriam fazer, na época, com sua permanência após a conclusão do emissário submarino, uma ligação “natural” de areia com a ilha Urubuqueçaba, na divisa da cidade com São Vicente. Uma ligação como aquela nesta vizinha cidade conurbada, entre a Ilha Porchat e o Continente que acabou com a praia do Gonzaguinha – de um lado e o recuo de areia de outro em cerca de 50 metros. Fazendo facilmente prever, aqui, a invasão de areia em poucos anos do jardim e dos prédios a seguir, causando sua derrubada.

Recentemente duas ressacas em duas semanas destruíram de forma inédita a murada e a Avenida Saldanha da Gama, na Ponta da Praia, em Santos, a cerca de cinco quilômetros da plataforma. Mostrando a ameaça do crescimento do volume do mar com o derretimento das geleiras do pólo norte causada pelo aquecimento global. E o risco de promover intervenções no mar que não causem respostas da natureza imediatas ou demoradas, mas inevitáveis.

As ocorrências recentes na capital São Paulo, com prejuízos econômicos e sociais, demonstram o que pode ocorrer como resultado da intervenção humana desavisada no regime de águas, com o aterramento de rios e ocupação das várzeas, delineando a tragédia que não podemos deixar ocorrer. Estamos vendo a resposta da natureza, é tempo de aprender.

Seis anos após a publicação do primeiro tomo de “O Capital”, em 1876, esse Friedrich Engels produziu um texto sobre as conseqüências remotas das ações do homem contra a natureza. “Nada ocorre na natureza de forma isolada, cada fenômeno afeta o outro e é, por seu turno, influenciado por este”, escreveu.

“O homem modifica a natureza e obriga a servir-lhe, domina-a (...). Contudo, não nos deixemos dominar pelo entusiasmo em face de nossas vitórias sobre a natureza: após cada uma destas vitórias ela adota sua vingança”, disse Engels há mais de 130 anos.

Pouco tempo depois de Engels escrever sobre os efeitos das intervenções humanas na terra, em 1876, o chefe indígena Seattle respondia de maneira similar aos que queriam comprar as terras dos índios na América, que terminaram mortos e devastados: “Como poderemos vender o que não é nosso? Esta terra é de nossos filhos e de nossos antepassados...”.

Em respeito a Santos e a todos os que amam nossa natureza brasileira, este maior litoral do mundo, vítima de enrocamentos marítimos impensados e não estudados, devemos exigir a retirada desta intervenção brutal e insana sobre a areia e sobre o mar, mantida para segurar escândalos de uma construção mal-feita.

“Vamos aprendendo pouco a pouco a conhecer as conseqüências sociais mais indiretas e mais remotas de nossos atos na produção, o que permite estudar também a estas conseqüências nosso domínio e nosso controle”. (Engels)

PAULO MATOS
Jornalista

P.S.: AS FOTOS DA PLATAFORMA ESTÃO NO SITE “NOVO MILÊNIO”.