segunda-feira, 24 de agosto de 2009

TRISTES TEMPOS DE MÁQUINA - O espaço divino das árvores da cidade

TRISTES TEMPOS DE MÁQUINA
- O espaço divino das árvores da cidade
Paulo Matos (*)
Agosto, 2009

Nestes tempos do centenário de Burle Marx, o maior paisagista brasileiro e descendente do mestre, genial cultor da beleza vegetal e de suas combinações cromáticas originais, a repressão às árvores nas calçadas segue intensa em nome do “progresso” que, insano, asfalta. Na ótica da limpeza e da assepsia, da suposta ordem sem conteúdo humano da recusa de fazer jardins em volta dos vegetais, nivelados com a sujeira em função da terra. São tristes estes tempos de transformação de jardins em garagens, como já se quis fazer nesta cidade.

Nos 55 anos do Parque do Ibirapuera na Capital, nascido de um horto florestal, nossa saudação à natureza. Em anexo, um pedido de socorro. As árvores foram declaradas inimigas, mostras da natureza que são. Dizem-nas “inapropriadas” pela expansão de suas raízes, que quebram as calçadas, os que tomaram os espaços à força para construir pouco-generosos espaços de cimento cinza ou negro de asfalto quente. Perdemos um seqüestro, este saudável, o de carbono, contribuímos para a crise global.

Com a retirada das árvores, perde o ambiente com a ausência de absorção de água pelas raízes, na impermeabilização progressiva pelo asfalto aquecendo o clima urbano. O que há de se mudar, ao invés do tipo de árvores, como designam os técnicos que ordenam podas abrindo espaço às pragas como epífitas destruindo as árvores e provocando seu corte – com perigo de quedas de galhos durante vendavais e tempestades.

Não é casual nem isolada esta tendência das pessoas reclamarem até do excesso de folhas que caem, um belo fenômeno da vida rejeitado, na mostra da sociedade se desumanizando. São tristes estes tempos de desvalorização do conteúdo humano do urbano, a beleza dos jardins e do verde, em que as pessoas se recusam a cuidar além de sua porta. Saudades dos tempos solidários.

Com a saída das árvores substituídas por espécimes esquálidos que raramente sobrevivem em nossos dias, perdem as agradáveis sombras e o frescor do ar, aumenta o barulho e o aquecimento global - o que ocorre com a retirada de árvores frondosas em função dos incômodos. Ou mesmo por razões supostamente estéticas, como na Avenida Ana Costa, onde centenas de árvores de mais de 50 anos foram arrancadas insanamente nesta ótica. Vem ai a devastação dos jamboleiros do Canal 3.

À expansão natural das raízes de espécimes chamadas fototrópicas, que ficam na superfície da terra e quebram os passeios em busca da luz, a reação dos moradores é cercar de cimento os espécimes da natureza, enforcando-os e retirando-lhes a possibilidade de oxigenarem-se através da terra. O reverso são as geotrópicas, que tem raízes que penetram no solo. Com as podas sem preparação, temos 60% das árvores contaminadas por pragas.

De quebra, perdemos com esta expansão do cimento gentis canteiros nas calçadas, trazendo flores à paisagem e ao convívio das pessoas - que só não gostam deles na porta de suas residências. Um grande número de árvores vive hoje sufocado pelo cimento e existem milhares de pedidos de remoção de árvores frondosas, por motivo de suas raízes quebrarem as calçadas impostas sobre seus sustentáculos. São tristes estes tempos de máquina.


(*) Paulo Matos
Jornalista, Historiador pós-graduado e Bacharel em Direito
Fone 13-38771292–97014788

Um comentário:

Helô Dopellganger disse...

Belo texto, gostei bastante.
Retrata muito bem os dias de hoje e me faz ter medo, pq que a cada dia q passa o homem desafia mais a natureza e esquece q depende exclusivamente dela pra viver...
Se com as árvores nas ruas o índice de poluição é alto,imagine sem elas!