segunda-feira, 31 de agosto de 2009

ANSELMO

ANSELMO

Paulo Matos (*)


Desmascarado e com um velho e desgastado discurso anticomunista típico e datado, Anselmo – o líder da Revolta dos Marinheiros de 64, insubordinação militar que quebrava a hierarquia e teria provocado o Golpe Militar - não volta sozinho. Os jornalistas que o entrevistaram muniram o Ministro Tarso Genro dos elementos para endossar sua tese e negar a Anistia a um delator covarde, atrelado à direita há quase meio século, antes mesmo do Golpe. Foi o que se caracterizou dezenas de vezes em um cuidadoso e articulado trabalho jornalístico. Sergipano, não tem semelhanças com Jonas, morto a pontapés, personagem obscuro e sorrateiro.

Confuso na tese que encampou, Anselmo justificou as delações às ameaças de morte que recebeu dos algozes que o teriam torturado, mas deles se tornou amigo. Admirador do delegado torturador da OBAN Sérgio Paranhos Fleury, Anselmo defende com entusiasmo os quadros da direita, aliados seculares. Seu advogado deveria retirar seu pedido de Anistia – que é para heróis e não para covardes -, em face do fracasso do depoente em justificar-se, mesmo tendo sido seminarista e ajudante do capelão. Quando protesta contra o atendimento da Anistia apenas à esquerda que confessa que não foi, nega o espírito da recomposição nacional após o enfrentamento.

O torturador Fleury se tornou seu amigo e lhe salvou a vida com uma operação plástica, depois de concluída a destruição da esquerda, como antes havia feito mesmo o agente infiltrado Cesar, mesmo sendo seu carcereiro. Traidor emérito, Anselmo alegou ter mudado de lado em um “click”, subitamente repudiando os ideais da Revolução Socialista sem nenhum estimulo Com um prolixo discurso de direita, insiste em sua tese de mudança ideológica mal contada e mal urdida de quem nunca foi.

Formado na fé católica, Anselmo quer salvar-se do fogo dos infernos, desde já dizendo que nunca foi marxista para não atrapalhar seus planos de ida para o céu de Bento XVI. Só não explicou como vive sem as verbas dos carrascos ate hoje – subliminarmente enunciando sua manutenção em quadros. Teria sido de Marighela o discurso que fez às vésperas do Golpe, análises que ele não teria mesmo condições de elaborar. Para ele, até FHC é “socializante”.

Com Anselmo ressurge todo um arcabouço capaz de deixar o relato de do livro “1964, um golpe de classe“, de René Armand Dreyfus - o plano de reversão de um projeto coletivo de reforma social no Brasil, os preparativos do Golpe de 64 - coisa de criança. Cooptado pelo sanguinário Fleury, de quem foi “cachorro”, delator, o único erro da esquerda que aponta corretamente foi sua admissão, permitindo sua ação deletéria da luta armada. Dela faz parte a ressurreição deste antigo líder da Revolta dos Marinheiros de 64, responsável por massacres. Armava ciladas para os antigos companheiros, agente da direita que foi e é. Quando encurralado, diz que sua memória “apagou”.

Eles, os quadros da direita, estão voltando por cima para o genocídio final ao estilo das superproduções cinematográficas dos gringos. Aparecem um de cada vez. Agora, Anselmo, velho rato de esgoto, o que entregou a própria mulher Soledad - e seu filho no ventre - aos carrascos, para não perder a oportunidade de matar seis ex-companheiros. Anselmo reapareceu depois de solicitar sua Anistia. Como os resistentes.

A volta de Anselmo será apresentada como “modernidade”, sem rancores, só a lembrança e as lágrimas. A postos, a proteção de Gilmar Mendes e do STF. Logo uma campanha lhe fará uma festa e uma homenagem, nesta era de falsos heróis. Eles voltam e outros se revelam em suas alianças e comportamentos, traem seu passado, voluptuosos espécimes da vergonha que se juntam aos que nos mataram e torturaram.

São tristes estes tempos. Eles dominam, se expandem, infiltram-se, protegidos, são feitos aliados do que colocamos no poder. Se abraçam e se armam por trás das cortinas para o golpe final, como Pinochet. É a ascensão ideal de uma proposta social privatista e egoísta que mata e destrói, que cultua o “Tanatos” - que para implantar-se necessitou de episódios trágicos como o Massacre da Lapa e do cabo da Marinha no esmagamento de ideais coletivos.

Anselmo reaparece. Mas sem nenhuma reação? O filme “O mistério do Expresso Oriente” daria a fórmula, em que todos e não um passageiro eliminaram um criminoso. O sentimento de dor e frustração dos filhos, netos, esposas e amigos são inevitáveis, em uma época em que a solidariedade e a bondade serão objeto de uma próxima Reforma Lingüística para sua extinção, conjugações de alienados que são com seus pensamentos antiquados de restauração das sociedades igualitárias. A modernidade sem honra se chama Anselmo.



(*) Paulo Matos Jornalista, Historiador pós-graduado e Bacharel em Direito

E-mail: jornalistapaulomatos@yahoo.com.br

Twitter: www.twitter.com/jorpaulomatos

Blog: http://jornalsantoshistoriapaulomatos.blogspot.com

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