sexta-feira, 10 de julho de 2009

ENCRUZILHADA, A HISTÓRIA DESMENTIDA

ENCRUZILHADA, A HISTÓRIA DESMENTIDA
Paulo Matos (*)


A Sociedade de Moradores e alguns habitantes do bairro da Encruzilhada, em Santos, encenaram uma votação em que se optou pela troca do nome do núcleo, assim historicamente denominado, escolhendo o do antigo dono das terras locais, o notável benemérito João Otávio. Equivocadamente, já há propostas de mudança na Câmara e isso desmente a história. Os vereadores devem rejeitar a alteração.

Em 1867, o então Presidente da Câmara, Inácio Cochrane, criou uma “via expressa” para a praia - a Avenida Otaviana, depois Conselheiro Nébias -, que seria o “Caminho Novo da Barra”. O encontro dos dois caminhos, o velho (a atual Rua Luiz de Camões) e o novo fizeram a encruzilhada que virou nome do bairro. É esta a raiz histórica e legítima da denominação do bairro, que não será jamais apagada por decisões efêmeras.

O Caminho Velho era por onde se chegava à praia do Boqueirão da Barra, que teria o Miramar de 1896 e o Parque Indígena de Julio Conceição, o maior orquidário ao ar livre do mundo e que deu origem ao Orquidário Municipal atual. Foi o primeiro ponto utilizado para banhos de mar. Era o caminho de quem morava no centro, Valongo e Paquetá. Saia da atual Praça da República e ia pela hoje Rua Brás Cubas, a atual Avenida Washington Luiz e Oswaldo Cruz.

O prefeito Silvio Fernandes Lopes denominou “Encruzilhada” o bairro, em 1968, em obediência à sua denominação tradicional e popular. Que agora se desrespeita, desconhecendo a origem secular da denominação e atribuindo-a a referência a religiões que não adotam. Não se trata nem de discriminação, mas desconhecimento histórico, simplesmente. A cidade perde com a mudança, intrinsecamente ligada à nossa história.

O notável benemérito João Otávio, menino pobre que enriqueceu e que doou sua fortuna para a Santa Casa, após destinar seus bens para a instalação e construção em sua chácara na Ponta da Praia do Instituto Escolástica Rosa, nome de sua mãe, decerto não gostaria de ver seu nome substituindo o do histórico bairro da Encruzilhada – cujas origens identificam a história de Santos, no cruzamento do antigo caminho para o mar.

Escrevendo sobre o bairro, diz Olao Rodrigues em seu livro “Cartilha de Santos”, editado em 1980, conta que “a atual Rua Luiz de Camões era...
“... um tortuoso caminho de terra mal batida e com águas pluviais estagnadas até que o sol forte as secasse. Tinha a designação popular de Caminho Velho e entrecruzava-se, obliqua, com a atual Rua Oswaldo Cruz. Não havia ainda a Conselheiro Nébias ou Otaviana, seu primeiro nome.Os dois atalhos formavam o caminho velho da barra” – onde havia uma cruz homenageando uma senhora que lá morreu.

Vamos rejeitar a mudança do nome e garantir a memória séria e histórica.

(*) Paulo Matos - Jornalista, Historiador pós-graduado e bacharel em Direito
e-mail: jornalistapaulomatos@yahoo.com.br
Fone 13-38771292 - 97014788

3 comentários:

Raul Christiano disse...

Seja bem-vindo a blogsfera, little Paul! Lembre-se que aquele estilo caudaloso de escrever, na Internet não funciona muito bem. Sucesso!!!

Carriço disse...

Paulinho,
Chego de férias e vejo a lambança que andaram fazendo com a toponímia Encruzilhada. Soube que o Waldir Rueda estaria apoiando o movimento, o que me espanta, pois em tese seriam os historiadores os primeiros a defender a tradição cultural de um povo. É mesmo uma decepção.
Adicionalmente ao seu texto, o qual subescrevo, relembro que a abertura da Cons. Nébias, via de traçado retilíneo e monótono, que Brito muito criticou, marca o início da urbanização da zona leste e da orla, pois ajudou a viabilizar a expansão da cidade, inclusive a ocupação de Vila Nova, Vila Mathias e Vila Macuco, primeiros loteamentos fora do núcleo central. É o abandono do urbanismo colonial, deliciosamente irregular, com pitacos da herança medieval lusitana. É a adoção do urbanismo neoclássico (de inspiração romana, pois as cidades do império romano eram planejadas em malha ortogonal, adotada mais tarde nos planos das cidades da América do Norte). Ao contrário do Caminho Velho, que respeitava a topografia, adotando o traçado dos pontos mais altos, evitando assim aterros desnecessários, o Caminho Novo marca o início de uma era de grandes obras na cidade e de grandes mudanças na topografia delicada da planície que se estende até a praia.
Enfim, este é o pano de fundo do encontro dos dois caminhos, a superação de uma ordem (a colonial) pela outra (a "moderna"). Uma "encruzilhada" urbana, a qual até hoje trilhamos.
Grande abraço,
Carriço

Unknown disse...

Paulo Matos,

Eu vi o Waldir Rueda algumas vezes aqui no plantão onde trabalho, ele carregando um livro que não me lembro do autor, que continha toda a história do Otávio, plantas de terrenos e suas situações, provando com isso a existência de um terreno que desde a Conselheiro Nébias até a Av. Ana Costa, terreno esse doado para a Santa Casa, usando esse recurso como sustentação da campanha, fazendo merecedor o novo nome de Vila Otávio, a história deverá ser preservada, eu ouvi relatos de pessoas quererem votar em Bairro das Palmeiras por ser palmeirense....sem condições....Mas a vontade do povo prevaleceu....enfim Vila Otávio, menos pior....um grande abraço e sucesso...