sexta-feira, 27 de novembro de 2009

RAZÃO E LIBERDADE - Proibição alcoólica e direitos humanos

RAZÃO E LIBERDADE
Proibição alcoólica e direitos humanos

Paulo Matos (*)
O governo Lula enviou ao Congresso, corajosamente, a proposta de proibição da propaganda de bebidas alcoólicas na TV, solucionando um problema histórico. Mas o lobbie fez cair a urgência na votação, que já não se sabe se acontecerá. E porque devemos firmar nossa negativa a "liberdade" que quer essa indústria? Ora, porque o álcool mata - e cada anúncio destrói milhares de vidas próximas a nós.

O filósofo Montesquieu, um daqueles que deram a base da Revolução Francesa, no sentido da razão argumenta que a liberdade não consiste em fazer o que se quer, mas subordina-a à lei, em um raciocínio claro: se um cidadão fosse livre para fazer o que a lei proíbe, já não o seria, pois outros teriam também poder sobre ele. Compreende-se, então, que a liberdade não concebe a invasão do outro pela propaganda, que sabemos deletéria.

Esse raciocínio traz inerente a igualdade de direitos, que conquistaria o mundo, instituindo o direito comum a partir do final do século XVIII. Logo, a lei disciplina e garante a liberdade. Diz-se que quem bebe fica "cheio de razão" - e faz bobagens. E desgraças. É um produto inerente ao sistema econômico capitalista, afinado e cheio de ilusão. E sofrimento.

A propaganda de bebidas representa a negação da ordem social e do papel do estado. Que permitindo a injeção de veneno das ampolas de álcool deixa degradar seu corpo social e descumpre seu compromisso de protegê-lo. É socialmente suicida a admissão de um hábito que mata consumidores e suas vítimas. Que gera o dobro de despesas com a saúde do que arrecada com os impostos que produz.

A indústria do álcool movimenta bilhões de dólares, mas é o único produto no mundo que tem uma relação custo-benefício negativo para a sociedade. Os prejuízos sociais decorrentes do ato de beber são gigantescos, vide acidentes, prisões, agressões, absenteísmo, crimes. Quem lucra com isso? Como admitir esta lógica liberal da defesa de empregos, da produtividade e do lucro? Só se, no processo de exclusão das massas improdutivas e excedentes, adotarem Malthus – o inglês que no fim do século XVIII propôs superar a insuficiência de alimentos com projetos de ampliação das taxas de mortalidade.

A propaganda alcoólica pela TV, dentro dos lares, atinge indiscriminadamente homens, mulheres, adolescentes e crianças, plantando ilusões de sucesso. Admitir lucro social dessa atividade econômica é inexplicável, fruto de poderosos lobbies. Cerca de 90% dos iniciantes têm menos de 18 anos, convencidos pela propaganda mentirosa de gente saudável e bonita que bebe.

Para o filósofo Hegel, liberdade é a necessidade compreendida, o conhecimento da necessidade. Não é só teoria, como para Spinoza, mas história – o conhecimento histórico da necessidade. Que não implica em escravizar-se a ela conscientemente, mas a determiná-la.

Necessidade coisificada, fetiche, induzir ao consumo alcoólico é negativo. Não é a liberdade um conceito fictício, abstrato e metafísico, mas vital na existência de bilhões de pessoas. Como na máxima de Louis Blanc, de que a liberdade não é só direito, mas poder – que exige seja exercido com regras, para exercício coletivo.

A liberdade não pode mais se tornar apenas privilégio dos mais fortes – favorecendo o predomínio do poder econômico e a escravização do homem pelo homem. Cabe ao estado intervir no equilíbrio entre liberdade e autoridade. Liberdade é ousar criar e transformar, não escravizar-se.

Liberdade, enfim, é o domínio humano sobre a natureza e sobre a própria natureza. A propaganda alcoólica é inadmissível como a tortura, proibi-la um ato de defesa social. Devemos argüi-la real e suprema, no império da sociedade humana – antes que seja tarde.

(*) Paulo Matos é Jornalista, Historiador pós-graduado e Bacharel em Direito
E-mail: jornalistapaulomatos@yahoo.com.br
Blog: http://jornalsantoshistoriapaulomatos.blogspot.com
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