terça-feira, 21 de outubro de 2008

A revolução de Antonieta

A REVOLUÇÃO DE ANTONIETA
Paulo Matos (*)

Nada será como antes nesta região. Em Guarujá, como Lula, a hoje prefeita Antonieta aliou-se e fez história, em uma das maiores e fulminantes reversões eleitorais do país nestas eleições municipais de 2008.

Em pleno século XXI de grandes transformações econômicas e sociais mundiais, continentais e nacionais, ao lado da ilha de São Vicente nasceu um processo histórico notável e apaixonante. No momento de mais uma crise cíclica do capitalismo e no questionamento mundial dos mecanismos do sistema gerador de pobreza, na micro-região do Guarujá/SP - onde se opõe radicalmente miséria e riqueza -, a contestação tem seu oásis.

Este oásis é o da projeção da transformação da qualidade de vida de milhares de pessoas que chegaram e vieram trabalhar e morar em dezenas de favelas. Ou que chegaram antes, mas que tem a mesma natureza de exploração e opressão.

Na também ilha de Santo Amaro ocorreu uma Revolução recente, um fenômeno municipal que consagra localmente esta era – o que exige comemoração por seu jeito humano. Era a eleição da prefeita Maria Antonieta, que propunha um novo jeito de pensar e governar, para livrar a cidade dos miasmas e fantasmas com quem convivera.
Jovem, liderança política antiga na cidade, Maria Antonieta de Brito é uma feição política atípica, eqüidistante dos demais, que traz em seu perfil a ternura que “Che” não queria perder nos enfrentamentos da luta ideológica. Suave, é diferente.
Militante das causas sociais, vereadora do PT, dirigente partidária, não aceitou a invasão do Partido pelos postiços que queriam descredenciá-lo como força-motor da mudança, submetendo-o a antiquados modelos de gestão e dominação. Saiu e candidatou-se pelo PMDB à Prefeitura. E consagrou-se no primeiro turno, junto com os que pensaram sempre uma sociedade melhor e mais justa.
A eleição de Maria Antonieta em Guarujá resgata o papel do outrora denominado “partido-ônibus” PMDB como eixo, como o que abrigando as esquerdas derrubara a Ditadura Militar. Partido que, outra vez, agregou estes setores em aliança com estruturas tradicionais - para transformar o antigo território produtor do óleo de baleia, que cresceu com os que chegaram e que de Guarujá se tornaram.
Não, não era nossa Antonieta fiel às idéias da rainha derrotada pela Revolução Francesa de 1789, esposa de Luiz XVI, de quem arrastava o nome: na verdade seu oposto, essa Revolução de Guarujá 2008 era dela e de seus companheiros.
Era uma Revolução sem decapitações, mas com as flores tiradas do chão da antiga Guaíbe dos indígenas e as flechas da poderosa Confederação dos Tamoios do Litoral Norte. Ela teve essa coragem. E apostou no sacrifício da mudança necessária, a que preconizara em seus discursos, porque tem a história na mão.
Uma Revolução apoiada pelas consciências locais, só as que ousaram enfrentar o poder, postura que assumiram como raio. E por grupos de esquerda celebrizados por sua presença na caminhada da transformação social, como o Movimento Revolucionário Oito de Outubro. Um feito incomum em nossos tempos, resultante da precisão coletiva dos objetivos.
Era preciso dizer que os guarujaenses seriam capazes de erigir a sociedade aos seus mais legítimos rumos de pão, terra e trabalho para todos. Desta feita a história foi acelerada pela ação popular que se opunha aos mecanismos tacanhos de cooptação, retrógrados porta-vozes do atraso.
No conflito acirrado com uns poucos resistentes, intitulados celerados porque perseguiam soluções ainda que sob o domínio das forças obscurantistas, nessa insistência a candidata sagrou-se prefeita, revertendo um resultado há muito previsto e acertado entre os poderosos coronéis locais.
Guarujá, a antiga Guaíbe dos índios, a ilha de Santo Amaro, foi um dos primeiros pontos, senão o primeiro, a ser visitado na descoberta brasileira, trinta anos antes da chegada de Martim Afonso pelas águas de Guarapissumã, como os nativos chamavam o mar que separa as ilhas e que eles cogitaram ser um rio.

O colonizador, após assumir a posse do território, deixou a ilha de Santo Amaro para Pero Lopes de Souza, doada por João III em 1534, dentro do plano de povoamento do Brasil pela iniciativa particular.

A criação da Estância Balneária do Guarujá ocorreu em 1893. Em primeiro de março de 1923 foi instituído o Distrito de Paz em Guarujá, que abrangia todo o território insular. E a 30 de junho de 1926 o governador Carlos de Campos assinava a Lei número 2.184, que desmembrava Guarujá e instituía a sua prefeitura sanitária.

Em 1832, Guarujá foi transformado em vila - e em fins do século XIX começou a tornar-se balneário da elite, atraindo migrantes que formaram uma multidão de explorados e favelados sem atendimento nem equipamentos sociais até hoje.

A 21 de janeiro de 1931, o Interventor Federal em São Paulo, João Alberto Lins Barros extinguiu a prefeitura sanitária de Guarujá pelo Decreto número 4.844, reintegrando-o a Santos. Porém, a 30 de junho de 1932 o governador paulista Armando de Salles Oliveira criava a Estância Balneária de Guarujá - pelo Decreto número 1.525. Era a emancipação administrativa.

No ano de 1947, a nova Lei Orgânica dos Municípios, decorrente da Constituição de 1946, emancipava muitas estâncias balneárias, hidrominerais e climáticas. Entre estas, Guarujá, pátria desta Revolução de Antonieta, que se tornou Município - o desta Revolução de Antonieta 2008. Agora, nada será como antes.