terça-feira, 17 de março de 2009

O BONDE DO FUTURO

Paulo Matos (*)
Impossível enquadrar o bonde longe da ótica do sistema econômico que precariza as relações de trabalho. Um grande mistério cerca este país e as nações dependentes do sistema econômico capitalista centralizado: é a norma que determinou a extinção dos bondes como meio de transporte coletivo eficiente e não poluente, confortável. O que sobrou para os países dominados foi a estratégia do capitalismo monopolista de sucateamento das condições de vida da população, por mais lucro.

A previsão é de que tudo piore - e muito -, com o "enxugamento" de custos e mão de obra para elevar os lucros e alimentar um sistema autofágico e criminoso que tem data final marcada e sempre adiada que mata seus consumidores.

Tínhamos relativamente mais bondes há 50 anos atrás do que ônibus hoje, imagine a superlotação e a crueldade do serviço atualmente. Lá, como serviço, o TC é subsidiado, aqui, objeto de exploração no radical da expressão.

Aliás, esse sistema econômico que transforma tudo em dinheiro transformou também o transporte em empreitada e liquifez qualquer característica de serviço - onde todos só querem tirar o seu e acumular, acumular, acumular como aquela zebra que fazia propaganda da loteria esportiva...

Faz parte de nosso mundo e de seus conceitos arbitrários que matam pela fome e pela guerra, quando não pela poluição e pela exploração abjeta, essa mudança de ótica. Quando se obriga a distâncias se obriga ao transporte como serviço - e tudo o que fazem é entregar a um mega-empresário todo o transporte brasileiro que ele mantém como o trabalho escravo encontrado em suas fazendas na Bahia.

Acabou o frescor, o "ronronar" do bonde, o vento no rosto, a opção pelo estribo, a beleza de seus metais e bancos brilhantes, seus funconários bigodudos e uniformizados de cáqui e gravata. Sobrevivem explorados trabalhadores liquidados pela dupla função no enxugamento máximo da dupla tarefa de cobrar e dirigir, desesperados que cometem acidentes constantes em veículos de carga adaptados. Gente que dá sumiço nos trólebus previstos em contrato em cláusulas que nem promotores e juízes dão jeito...

O retorno ao padrão bonde implica em se mudar o sistema, tendo como alvo os usuários e não o lucro de uns poucos que se pagam por baixo dos panos em transações covardes feitas à custa do sacrifício de pessoas, a quem chamaram de "escravos modernos" - os usuários do transporte coletivo nas cidades, sofridos, esmagados, sacudidos, a espera, pagando caro, calorentos, em carros fechados de janelas trancadas feitos de lata. Sobrevivem os bondes em cidades "atrasadas" da Europa.

Diziam que eles atrapalhavam os carros mas, por sua natureza coletiva, gregária, eram os carros que os atrapalhavam. A expansão capitalista do transporte individual criou o caos urbano da fumaça e da morte, quando poderíamos salvar as metrópoles com transporte coletivo eficiente para impedir o desastre e até a "alegria" de espécies como Maluf que disse ficar contente em ver as ruas repletas de carros parados porque isso para ele era "progresso"! E que "progresso" esse que nos traz o estado capitalista, repleto de dor e sofrimento para a espécie humana e submetida a ditaduras arbitrárias que só criam modelos de morte. Ah, que saudades do bonde do futuro!