domingo, 11 de outubro de 2009

POUCA FARINHA

POUCA FARINHA

Paulo Matos (*)


Na fonte, uma placa: "Dona Noquinha e moradores desta praia ficam gratos pela valiosa doação dos irmãos Rafael e Modesto Roma. Deram à pobreza a maior riqueza: Água. 31-5-1953". Era o benefício construído pelos herdeiros dos antigos proprietários da área da Pouca Farinha, a família Modesto Roma.

Parte da área era do Serviço de Patrimônio da União e foi um dos primeiros núcleos visitados pelos portugueses no Brasil após a descoberta, o primeiro em nosso litoral. A expedição denominadora parou lá antes de vir para o porto de São Vicente, do lado de cá.

O núcleo é uma ocupação iniciada em torno do forte de Santo Amaro, construído ao lado em 1584 pelos espanhóis para defender a costa de piratas, cedido ao Circulo Militar em 1956 e retomado pela União em 1969. Ocupado no final dos anos 30 e é um favelão a beira-mar, com casas de concreto e de madeira que ainda hoje cresce com construções clandestinas feitas à socapa durante a noite, com pescadores e pequenas plantações.

Os moradores, hoje em torno de cinco mil, bebiam água da nascente antes da fonte e aguardam há décadas pelas melhorias prometidas – como uma estrada que a SUDELPA iria fazer ligando o núcleo à praia do Guiúba. Servida por barcas, água e luz mais posto policial, a comunidade fundada por pescadores vive e se desenvolve. Logo, a poluição gerada pela dragagem do porto eliminará os meios de sobrevivência de milhares, ali e em todo o litoral.

A fortaleza se ergueu durante a dominação espanhola sobre Portugal, no reinado de Felipe II da Espanha e I de Portugal. Antes, em 1583, o pirata Edward Fenton havia invadido a costa, depois Cavendish. Foi reconstruído em 1725 e seu patrono Santo Amaro (ou Mauro) se tornou santo por andar sobre as águas. Deveria ser patrono dos salva-vidas. Sua data é 15 de janeiro e nasceu no século VI, filho do senador romano Antichio.

Nos anos 50 a fortaleza recebia centenas de visitantes semanais e estava sendo restaurada, no esforço do então presidente do Circulo Militar ali instalado Rodolfo Petená, capitão reformado do Exército. Hermenegildo José de Oliveira, antigo zelador do Forte nessa época, como nos contou seu neto – o psicólogo Rivaldo Leão -, fez pesquisas arqueológicas no local - em que atuou na restauração do local feita com base em rifas feitas e vendidas por Petená, naquela considerada principal construção militar do estado.

O primeiro povoador da área foi Jorge Ferreira, que chegou junto com Martim Afonso em 1532 e o núcleo teve construída uma capela em homenagem a Santo Amaro. Que apesar de ter desabado e outra ter sido feita em seu lugar continuou com o nome original, mesmo após a concessão da capitania a Pero Lopes de Souza, irmão de Martim Afonso.

A fortaleza da Barra Grande ou e Santo Amaro, que escapou de ser de São Miguel, caiu em desuso militar em 1911 – quando teve como último comandante o capitão Souza Filho, sendo transformado em posto fiscal e depósito de pólvora. A construção pelos espanhóis da fortaleza que reuniu a comunidade local decorre de uma circunstância de poder, que delegou à Espanha a posse de Portugal por 60 anos.

Essa circunstância decorreu da aventura diplomática do século XVI, quando o reino português é colocado pelo jovem rei D. Sebastião em uma encruzilhada após este levar à morte toda sua família em uma viagem de conquista a Alcácer Quibir, em Marrocos. O sucessor mais próximo do reino era Felipe II da Espanha, que se tornaria o I de Portugal, pois era neto do ascendente D. Manuel, “o venturoso” com a rainha Isabel. Essa situação de dependência perduraria até 1640. Dela nasceu a Pouca Farinha.


Paulo Matos
Jornalista, Historiador pós-graduado e Bacharel em Direito
E-mail: jornalistapaulomatos@yahoo.com.br
Twitter: http://twitter.com/jorpaulomatos
Fone 13-38771292 - 97014788

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