domingo, 3 de janeiro de 2010

AHMADINEJAD, IRÃ E DEMOCRACIA

AHMADINEJAD, IRÃ E DEMOCRACIA

Paulo Matos (*)

Desmascarando conceitos de democracia, como fez o escritor Saramago ironizando a existência do instituto de origem grega que nem lá existia, a entrevista do líder iraniano Mahmoud Ahmadinejad coloca elementos na discussão que, senão novos, são bastante consideráveis a respeito dos modelos existentes – ou melhor, inexistentes. Como afirmar a plenitude dos direitos sociais diante da miséria mundial? Ahmadinejad é autoritário? Cadê os outros?

Se o líder iraniano é sincero ou não em seus conceitos cabe discutir, mas nas questões aqui analisadas são indubitáveis suas afirmações. O fato indiscutível é que seu estado na promove genocídios como Israel e os EU. E o que fica claro é que as tentativas e impedir as tratativas entre os dois países são instrumento de interesses que não são os do Brasil e, assim, não devem ser considerados. Mas os méritos de suas colocações vicejam em torno do conceito de democracia, que relativizam o conceito.

“Certamente a democracia no Brasil e no Irã é mais avançada quando comparada com o resto do mundo”, afirmou Ahmadinejad. Para ele, o Brasil é uma espécie de modelo de democracia, desconhecendo as questões da falsa representatividade da população em função da ausência do voto por cabeça, por exemplo – em que dependendo da unidade federada ele vale mais ou menos no parlamento. No Irã, a dúvida é premente, também. Nos dois, o privilégio econômico de classe aniquila o conceito.

Mas a questão principal é seu enfoque sobre o papel do dinheiro nesta equação: "Nos lugares em que o dinheiro define a participação no governo, onde está o lugar do povo?", indaga, referindo-se ao processo eleitoral nos Estados Unidos, circunscrito a dois partidos. Diante da “liberdade” de financiamento privado das campanhas individuais, onde fica a verdadeira liberdade?

Mahmoud defendeu, porém, a restrição existente no sistema iraniano, em que apenas algumas religiões, ditas "divinas", podem participar da política. É algo como a restrição à participação dos comunistas em passado recente, aqui – lá uma idiossincrasia local que só remonta às estratégias para se evitar a democracia plena, como se faz em todos os países do mundo. Lá, o Baha'is não é aceito como religião, mas como um grupo político. Por isso, não é reconhecido pela Constituição no estado teocrático, como o inimigo Israel, de práticas similares em relação aos árabes. É uma questão política. A China resolveu isso nacionalizando a religião.

O Bahá'ís (em árabe, “glória ou “esplendor”) é uma religião monoteísta fundada por Bahá'u'lláh, na Pérsia durante o século XIX, que não possui dogmas, clero ou sacerdócio. Estima-se que existam cinco a seis milhões de Baha’is espalhados por mais de 200 países e territórios.São seus “mensageiros” Krishna, Abraão, Buda, Jesus, Maomé e, mais recentemente, O Báb e Bahá'u'lláh.

Na questão nuclear, as razões de Ahmadinejad são óbvias, pois os que se opõe ao seu uso já a utilizam, acusações hipócritas. Coloca que “A democracia que está sustentada no domínio do poder e da riqueza, essa não é democracia. Basta olhar para Estados Unidos – são dois partidos que participam”. Como negar a afirmação do líder iraniano? “Nos Estados Unidos, o poder durante os últimos 100 anos está dividido entre dois partidos apenas. Mas nos lugares em que o dinheiro define a participação, onde está o lugar do povo?” Difícil contestar o líder iraniano.

Enfim, a rejeição automática ao líder iraniano é fácil, diante de seu vocabulário e maneiras que não estamos acostumados. É algo como a oposição sistemática a Chávez e Fidel, Evo Morales e em breve ao líder eleito no Uruguai – gente que ousa enfrentar o liberalismo capitalista mesmo que gerador de miséria em nome do “crescimento”. Difícil é a sua contestação razoável. Atribuir-lhe condição autoritária é chover no molhado dos autoritarismos mundiais, políticos e econômicos como as ditaduras do poder econômico que nega, na essência, a democracia. O resto é blá. Ou Baha`is.

(*) Paulo Matos
Jornalista, Historiador pós-graduado e Bacharel em Direito
E-mail: jornalistapaulomatos@yahoo.com.br
Twitter: http://twitter.com/jorpaulomatos
Fone 13-38771292 - 97014788

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